Desafios e oscilações de mercado marcam as perspectivas para o futuro do trigo no Brasil

Cultivares

09/02/2022

Publicado por Jean Paterno

O ano de 2022 chegou com muitos desafios e incertezas para o trigo em todo o mundo. Questões climáticas e a volatilidade do mercado podem influenciar muito a produção e, consequentemente, os resultados de toda a cadeia. Diante disso, surge a preocupação de como tornar o setor mais competitivo e rentável em meio a esse cenário. Essas e outras questões foram debatidas no painel Trigo: oportunidades e desafios, promovido na 34ª edição do Show Rural Coopavel, nesta semana, com a presença de autoridades do segmento. Da pesquisa à indústria, o evento envolveu todos os elos do setor produtivo.

A safra nacional de trigo atingiu produção recorde em 2021, mesmo com adversidades climáticas durante o desenvolvimento da lavoura. E, apesar da maior disponibilidade de trigo no mercado interno, a importação seguiu em alta no segundo semestre do ano passado, e, para os especialistas, esse contexto deve continuar o mesmo em 2022. Atualmente, o Brasil negocia principalmente com a Argentina para suprir essa demanda.

“A pandemia não afetou o consumo de trigo. Ele continuou a sua evolução normal já que é inelástico a uma série de fatores. O que aconteceu nesse período foi uma mudança de perfil de consumidor. Com períodos mais longos em casa, percebeu-se que o consumo de farinha doméstica aumentou bastante”, pontua o superintendente da Abitrigo, Eduardo Assêncio. Com relação aos preços, o especialista comenta que a perspectiva para os primeiros seis meses de 2022 é de manutenção da firmeza para as cotações do trigo no Brasil.

Avaliando-se as atividades de campo, na última temporada, o Rio Grande do Sul ultrapassou a produção de trigo do Paraná, estado que normalmente possui a liderança nacional. Já em relação à próxima, a expectativa é que os produtores continuem optando por aumentar a área com o cereal, como ocorreu na temporada anterior, influenciados pelos altos valores pagos no mercado atualmente, mesmo com o maior custo de produção.

“A política de crescimento do Brasil em termos qualitativos, olhando para as demandas do mercado, é crescente. Um dos poucos países que olham o mercado para produzir trigo. E isso é política dos grandes líderes em trigo, como Canadá, Estados Unidos e União Europeia. O fomento de trigo aconteceu olhando a demanda do consumidor”, afirma Assêncio.

Incentivo

Em setembro, durante o 2º Show Rural de Inverno, a Coopavel lançou um programa especial para incentivar a triticultura na área de abrangência da Coopavel, em 23 municípios do Oeste e Sudoeste do Paraná. Considerado o maior programa de estímulo ao trigo do Brasil, o programa oferece condições especiais aos produtores rurais. “De todos os insumos, o conhecimento é o principal, e o Paraná é um grande produtor de trigo, por isso é importante que nós tenhamos simpósios sobre a cultura, para unir vários setores que formam a cadeia, como agroindústrias e produtores rurais e, juntos, traçar uma estratégia e uma política de trigo para o nosso país”, salienta o presidente da cooperativa, Dilvo Grolli.

Autossuficiência

Cultivado desde o primórdio das civilizações, o trigo é considerado essencial à alimentação humana – porém, embora presente no pão de cada dia (e em outros alimentos que apetecem o mundo), o cereal é a única commodity que o Brasil não tem autossuficiência. Dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) apontam que, aproximadamente, 50% do trigo utilizado no país têm origem estrangeira.

“Nós somos abastados porque temos a Argentina e o Paraguai, ambos com muito trigo, do nosso lado, então estamos um, pouco acomodados. O principal entrave para o crescimento do setor é a falta de políticas estratégicas para o desenvolvimento da cadeia produtiva”, opina o superintendente da Abitrigo.

Trazendo a visão da indústria moageira, o presidente do Sinditrigo-PR e CEO do Moinho Arapongas, Daniel Kümmel, acredita que a autossuficiência também demanda força política com os sindicatos e cooperativas. “Ainda vai levar alguns anos, mas vamos chegar próximo da autossuficiência, se a conjuntura favorecer”, observa.

Setor moageiro

A indústria moageira tem sido fortemente impactada pelo mercado mundial do trigo. O momento, na avaliação de Kümmel, é bastante complexo. “A inflação pressionou muito os preços para a aquisição de trigo, que são históricos. Nunca pagamos tão caro por uma tonelada de trigo, e isso está defasado diante do repasse de preço para o mercado. Com isso, estamos preocupados em como se estabelecerá essa relação entre preço de compra e preço de produtos derivados de trigo”, ressalta.

Com o maior parque moageiro, o Paraná representa 30% de toda a moagem nacional e também se consolida como o principal produtor de trigo. “O Paraná já tem espaço consolidado e ainda existe muito para crescer. As variedades estão vindo e os próximos dois anos serão uma fronteira de abertura muito importante”, informa.

Melhoramento genético

Nos últimos anos, a tecnologia na lavoura de trigo evoluiu passando por manejo e sementes de alto potencial. Um processo que reflete o trabalho de melhoramento genético. “O trigo carrega questões que são bem peculiares. O produtor tem um interesse fundamental que é a produtividade. Ele precisa colher mais por hectare, alqueire, para pagar sua conta e ter sua rentabilidade. Já passou o tempo em que o inverno estava ali só para fazer palhada, e que se o trigo empatasse estava bom porque ele estava beneficiando a soja”, declara o gerente comercial Latam na Biotrigo, Fernando Wagner.

Ele enaltece que a interação do setor produtivo com a pesquisa é fundamental para o desenvolvimento de soluções tecnológicas. “A cultura do trigo vem recebendo muitos investimentos em tecnologia e inovação, sendo que nesses anos de parceria e aprendizado mútuo vem assegurando a disponibilidade de sementes com alta qualidade acelerando o acesso de nossas cultivares aos multiplicadores de sementes e estes aos triticultores brasileiros”, ressalta.

Guia de Qualidade da Farinha

O evento no Show Rural também foi oportunidade para o lançamento do Guia de Qualidade da Farinha. Fruto de parceria da Biotrigo Genética com a Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo), o material é voltado especialmente para produtores e cerealistas e aborda de forma acessível as principais análises realizadas na farinha de trigo pelos moinhos e indústria. “O guia possui o propósito de aprofundar e especializar a relação do campo com os fabricantes”, declara Wagner. Segundo ele, o objetivo do guia é fazer com que qualquer pessoa entenda a importância das análises para o produto final. “Não existe trigo ruim. Alguns trigos atendem muito bem a indústria de pães, outros atendem melhor a de biscoitos e assim por diante”, explica. Dessa forma, as análises buscam dar as características desejadas pelo consumidor ao produto final.

Mas qual a vantagem para o produtor em conhecer esses processos? Conforme o profissional, o planejamento do agricultor deve ser estratégico, visando maior liquidez e rentabilidade. “Conhecendo melhor as análises, ele vai pensar de acordo com o mercado em que está inserido. O agricultor sabe cultivar trigo, conhece muito do negócio dele, mas qualidade de trigo também é negócio dele, e quanto mais ele conhecer, terá mais capacidade de se posicionar e entender um pouco dessa dinâmica do mercado. Se determinado moinho produz farinha para panificação e massas, o produtor pode escolher uma cultivar que atenda essas especificações”, exemplifica.

Legenda 1

Painel Trigo: oportunidades e desafios, promovido na 34ª edição do Show Rural Coopavel, com a presença das principais autoridades do setor produtivo

Crédito: Assessoria.